quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Parte I


Quando Lisbela tinha treze anos, conheceu Arlindo – um caminhoneiro conhecido da pequena e pacata cidade de Cabrobró. Logo no começo dessa futura relação, Ela sentiu que estava entrando numa cilada, e o futuro provou ser verdadeiro a este pressentimento.
Em tudo eles combinavam: desejos, sonhos, musica e boemia. Alem de supostos amantes, eles eram grandes amigos, e nada nem ninguém discordava desse fato. Eles estavam muito bobos um pelo outro, no entanto, não conseguiam expressar tamanho sentimento, pois o publico censurava aquele romance avassalador. Quando esse efeito anestésico da paixão por Lisbela foi passando, Arlindo foi mudando seu comportamento.
Enquanto Lis sonhava com o seu bem-amado, Ele, por sua vez, aproveitava o auge da sua juventude – que era repleta por falsos brilhantes. De nada importava o quanto ela se sacrificava por ele, Arlindo estava entrando no fantástico mundo de Woodstock, e isolando a Donzela vagarosamente da sua vida.
Mas como se tocar que estava faltando espaço para Ela no mundo de Arlindo? Não se tocou. E ainda nas noites mais sombrias e tenebrosas, lá estava a Bela a esperar o seu Dom Juan voltar de algum qualquer lugar, sujo por outros batons que se tornavam invisíveis aos olhos da paixão sufocante que reinava absoluto no coração da Cigana de olhos cor de mel.
Havia rumores da suposta vida paralela que Arlindo sustentava longe de Lisbela, e Ela até sabia, mas não conseguia usar as migalhas de tempo que tinha ao lado do seu Rei para fazer a Criatura mal amada que vestia azul anil. Na verdade, a Pobre tinha medo de confrontá-lo e Ele ignorar o sentimento dela, partindo de vez para bem longe da Senhora Carência.
Com o tempo, nada mudou. A vida paralela de Arlindo evoluía, e o romance das seis que ele tinha com Lisbela, regrediu. A única pessoa que não percebia isso era a própria Donzela. As visitas do rapaz ficaram cada vez mais raras. O vinho barato e um disco de Roberto Carlos que Ele esqueceu na casa Dela, eram as únicas companhias que ela tinha quando insistia em esperar o Arlindo, que nunca em sua vida disse ao certo quando chegaria.
Lisbela passava os dias e as noites ao lado da porta, do vinho e da radiola, na espera de Arlindo, que já há dois anos não mandara noticias. Jamais Ela imaginara que longe Ele se encontrava. Os amigos até tentavam consolá-la. Diziam:
- Lisbela,Deixe de ser ingênua, Mulher! Arlindo se foi com Inaura. Já tem filhos e não voltará. – na pura e mais árdua sinceridade de Margarete, a vizinha.
Falavam também que o moço já tinha batido as botas há um ano, e que nem uma carta deixou para a boba da Lisbela.
Acontece que diante de um passado tão mágico, tão verdadeiro, era impossível se convencer que tudo não passou de ilusão. Pois quando Arlindo se fazia presente, tratava Lisbela da forma mais singela e sincera que um Cavalheiro pode tratar uma Dama. Ele a amava de verdade, e fez dos momentos que passaram juntos os mais felizes. Ele dava adrenalina ao coração mais medroso do bairro. Dizia coisas que nem o mais apaixonado Shakespeare disse em suas obras. Deu vida, forma e conteúdo a uma mortal que antes de conhecê-lo só sabia bordar suas toalhas. Ele a fez.
Lisbela já tinha descoberto todas as falcatruas de Arlindo, mas também já tinha perdoado, e a única coisa que desejava era ouvir o toque das mãos dele, batendo naquela porta velha que a muito ninguém batia.
Passaram-se cinco anos. Ela já estava diferente: suas curvas eram mais preenchidas por carnes tão saborosas que todos os homens do bairro desejavam se fartar. Seu olhar manso e ingênuo se transformou em olhos de cigana – oblíquos e dissimulados. Os cabelos já com outros fios. E principalmente, o jeito de encarar os fatos já se encontrava maduro.
Um dia, passando por aquela antiga rua, um amigo de infância parou em sua casa para beber água, e disse algumas palavras que provocaram uma terrível depressão em Lisbela. Ela se lembrou de cada detalhe daquela historia que acabara em abandono. Comprou um vinho barato, procurou O disco de Roberto Carlos, e passou o resto da noite chorando e esperando Alguém bater naquela velha porta. Trágico.
Ninguém bateu. Ela acordou zonza de ressaca moral, e continuou a sua vidinha parada e depressiva. Longe de toda e qualquer noticia daquele primeiro e derradeiro amor que roubou sua identidade, e fugiu para longe, deixando a pobre entre os poucos cuidados dos vizinhos pervertidos e amigas invejosas.
Há quem diga que ainda hoje, Lisbela espera ouvir a porta bater, e aquele Homem entrar sujo de batom, com cheiro de cigarro, pedindo socorro e reafirmando que o amor que Ele dizia sentir ainda vigora naquele coração de pedra que pertence a mais pura dama de Cabrobró: Lisbela.


Continua...

James Dean e Natalie Wood (Rebelde sem causa).



2 comentários:

  1. Seus posts estão cada vez mais emocionantes e instigantes!
    Será que Arlindo volta algum dia para os braços de Lisbela?

    Aguardo ansioso os próximos capítulos dessa novela mista de amor e sofrimento, sentimentos que caminham entrelaçados durante toda a eternidade.

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  2. uHuuuLL!
    Ja pensou em escrever um filme? huhea
    Tem mto talento pra isso..imaginação não falta!
    E o meu orgulho so cresce! *-*

    s2!!

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