Talvez o maior defeito de Bibia no
momento seja amar demais. Não que o objeto amado não mereça tamanha fascinação,
mas por uma questão de saúde mental: amar demais é desesperador.
Ama, ama, ama, ama muito. Ama demais.
Não há limite nisso. E na mesma proporção que esse amor a faz feliz, ele também
a sufoca, como tudo o que é excessivo. Desaprendeu a dizer não, não sabe mais o
que é um piti, não se lembra qual foi o ultimo dia que fez prevalecer a sua vontade...
Mudou completamente sua conduta, mas nada forçado, tudo de modo natural e feito
por ela e sua intuição. Está irreconhecível, e confessa que em nenhum outro momento
passado na vida, se viu numa situação de tamanha devoção a um ser humano:
sente-se babaca por sentir esse amor incondicional.
Não consegue mais pedir algo, nem fazer
um convite, pois sempre acha que estoá incomodando. Evita ligar, pois sabe que
ele não gosta de atender o telefone. Não discorda de suas idéias, e com isso tenta
sempre ver a razão dos pensamentos dele. Não fala mais das suas frustrações e
medos, sabe que ele não tem mais paciência para os problemas dos outros, ou
pelo menos para os dela. Até quando ele pergunta se está tudo bem, ela tenta
disfarçar a cara de enterro, coloca um sorriso no rosto, e tenta amenizar o
clima de chatice que estava no ar.
Ciúme. Este já deve estar com saudade
das suas indagações. Não expõe mais, não pergunta nem faz birra. A ultima vez
que o sentiu e tentou falar, recebeu costas como resposta. Chorou, quis morrer,
achou uma falta de respeito e consideração, e ainda sim, foi atrás e pediu
desculpas por estar enchendo o saco dele com ciúmes infortúnios e inoportunos. Desde
então, tem sempre colocado este antigo instinto no bolso e engolido cada gota de
ódio que sente quando sabe de toda a verdade que não é claramente exposta.
Recebe muitos carinhos, e isso a
fortalece. Às vezes, ele pára do nada, e diz ser louco por ela. Outra hora, ele
observa o seu olhar, e fala palavras doces que a enchem de ternura. E mesmo no
meio de tantas brincadeiras e horas quaisquer, ela sente que é amada, sente que
ele gosta de estar com ela, mas, sempre si pergunta até quando, e olha as horas
como se fosse a ultima vez. De um certo dia para cá, pegou o hábito de dizer
que ele é a sua vida. Tem absoluta certeza que não entende a veracidade do que
é isso. Tudo o que pensa para si e pro futuro, pensa a dois. Desde que acorda,
ele é a primeira pessoa que vem em seu pensamento, e imediatamente, pede que
uma força superior que esteja ao alcance dele, o proteja e o faça feliz e bem. Passam
as horas do dia, e ela continua intercalando seus afazeres com o pensamento
nele. E enfim, ao se deitar, antes de adormecer, conversa com alguém sagrado e
divino, suplicando sua benção e proteção para esse alguém que tanto, tanto ama.
Pensa que perdeu todo valor próprio, e passou a supervalorizar o ser que a foi
dado a cuidar e amar, independente de defeitos e merecimentos.
Bilhetinhos escondidos na bolsa, café
da manhã na cama, mensagem na madruga – isso tudo é fantasia de novela das
oito. No entanto, não posso negar que uns carinhos desses fariam muito bem à
Bibia, naqueles dias em que se sente o lixo do deserto mais esquecido do mundo.
Do jeito que ela vem pensando que ele é muita areia pro seu caminhãozinho, acho
que se isso acontecesse com a coitada, ali mesmo teria uma taquicardia e cairia
dura na frente dele. Brincadeiras a parte, Ela vem mesmo se sentindo como um
bichinho do mato, que não tem cacife suficiente para andar de mãos dadas, sair
para festas, ser fotografada ao lado dele, declarar o seu amor publicamente... Pensa
que o envergonharia muito, e evita dar corda para essas suas carências.
E assim vai seguindo a tola e linda
Bibia - amando demasiadamente um ser que diz também amar, mas que não tem a
mínima noção da dimensão do amor que sente, nem tampouco das loucuras que é
capaz de fazer movida por esse sentimento exageradamente insano e ínfimo.
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